O riso dos
ratos
O gato trilhava pelo muro e ele espreitava
com uma faca e a mangueira na mão. O gato avistou uma presa, ainda no muro. Com
seus olhos noturnos, preparou o bote. Ele, com a mangueira, jogou água. O gato,
distraído, caiu perto dele. A faca amolada só precisou de uma passada para
cortar as costelas do gato. Os miados foram tão altos, que alguns vizinhos saíram
de casa para ver o que era.
Uma vizinha diz:
_Mata logo o coitado.
_Primeiro: ele saiu correndo feito gatinha
coitada. Segundo: vai cicatrizar. Disso, terei outra chance de cortá-lo mais
corretamente. – ele, risonho, mas calmo, afirma. A vizinha não teve nenhuma
reação.
Ele se gabava sempre: já cortei rabo de
cachorro depois dele adulto. Arranquei olho de sapo. Fiz corte na pica de
vira-lata pra ficar parecendo língua de cobra. Arranquei asa de passarinho.
Afoguei alguns gatos que caíam na arapuca que aprontei aqui em casa. Eles
caíam, eu os pegava e os afogava. Quando via que estava perto de matá-los,
tirava da água, fazia um corte, sem precisão, em suas garras e os deixava ir,
cambaleando. Já cortei rabo de rato, olhos de rato, pelo, couro também. Não
acham que os ratos merecem? – perguntava sorrindo.
_Uma vez, um cachorro que eu estava capando
no momento em que ele cruzava com uma cadela, me mordeu. Arranquei duas patas e
os dentes de baixo de sua boca. Com a cadela, que ficou com a pica do cachorro
em seu cu, amarrei ela com uma força que a fez sangrar. A deixei sangrar até
estar perto de morrer. Aí eu confesso, senti um pouco de pena, então comprei
bombas de São João, aquelas de cem, muito fortes, e fiz a cadela explodir.
Tenho certeza que ela me agradeceu por esse ato.
Alguns vizinhos gostavam. Outros entendiam o
seu prazer. Outros o odiavam. Outros o achavam louco. E mais outros e tantos
outros achavam tudo isso normal e até poderiam fazer igual.
Uma noite em que ele assistia à TV em sua
sala, um gato, sem parte de seu pelo, adentra o local. Ele, de costas para a
porta e de frente para a TV, não vê. Entram quatro sapos. Dois sem uma das
patas. Outros dois com o corpo inchado, como se tivessem experimentado sal na
pele. Entram mais gatos, cada um com uma parte do corpo arrancada: patas,
olhos, dentes, pelo, pênis, orelha etc. Entram cachorros, todos mutilados e
silenciosos. Um desses cachorros, com o ânus ainda sangrando muito, como se
tivesse sido penetrado por um cabo de vassoura, parecia o líder. Alguns ratos,
que já esperavam os outros animais embaixo do sofá, contentes com o momento,
fizeram barulho, sons de riso. Apesar de estarem mutilados, eles ainda riam.
Ele se levantou.
_Esse som é de rato!
Quando olhou para trás, viu uma “multidão” de
animais em sua sala: gatos, cachorros, ratos, pássaros, tartarugas, lagartos,
etc. Antes que tivesse tempo para falar ou fazer alguma coisa...
A porta de sua casa foi fechada por duas
tartarugas. Uma sem o casco, outra sem um pedaço do pescoço e menos uma pata.
As janelas foram fechadas pelos pássaros. Muitos depenados e outros mutilados.
E depois dessa noite, nunca mais se ouviu falar dele, nem de suas histórias.
E os ratos riam.
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