Três poemas do livro Canibaversos
Semana
Saborear comoção
na segunda-feira
cura solidão.
Minha preguiça
come terça-feira
e espreguiça.
Minha vida
toda quarta-feira
se multiplica.
Minha língua
traduz quinta-feira
você inteira.
Meu humor
toda sexta-feira
fica beija-flor.
Meu afago
pede sábado
bife acebolado.
A liberdade
todo domingo
permanece sorrindo.
Transformação
chuva
cai
apressada
mas
é lento
seus
transformam
Fim de tarde caramelada
Para Tony
Num fim de tarde
que não tarda, arde
uma tristeza em febril firmeza
que não parece, mas sabe
paira em desarmas e entraves.
O sol desce sem alarde
como crônica sem mecânica
todo saudade e amor
armando seu caminho
para se pôr.
É sua forma de amar a descida
sem precisar flutuar.
Sol só precisa amarelar
e estrelar cheio de luz e vida.
O cachorro corre dum lado
pro outro, late.
Corre como se quisesse
alcançar a verdade.
Uiva, bate-se nos cactos
suspensos do jardim
extenso, intenso
em nós sem fim.
Reluz de sua pele marrom
cheirosa
uma luz neon
e acintosa
espalhando ritmo e som.
Ele vem ao meu lado
como se fosse falar algo
e entendesse cada passo
de meu cadafalso.
Mas não fala e não late.
Seus olhos são mel
dedicado e delicado.
Sentado, cão e educado
respirando e intacto
compassadamente
sem conspiração, ele fala
sem qualquer artimanha
ou máscara.
Sonoras notas solares
confluem beleza
o sol e meu ouvido percebem
a sua voz vermelha.
E, no fim da tarde caramelada
conversamos infindos.