domingo, 27 de outubro de 2013

IML - conto do livro 'Imagine alguém te olhando do escuro'

IML

Antônio afirma a sua história: o cheiro de carniça pode aparecer quando você está sozinho, ou rodeado de uma multidão, você pode senti-lo deitado na cama, batendo papo em lugares privados e públicos, em qualquer lugar o cheiro de carniça pode grudar em seus orifícios nasais e povoar a parte capilar do mesmo. Sim, o cheiro de carniça, do Demônio, aparece em qualquer lugar, basta ele estar te mirando, te olhando nos olhos. O Demônio, quando está do seu lado, ele fede e te fita nos olhos.
_Em qualquer lugar? - perguntou Amanda, uma amiga que ouvia a história.
_Sim. Quando o Demônio está envolto por você, ou a você, depende de como se interpreta, ele se mostra por graça própria. Ele sabe que rir faz bem pra vida, por isso se diverte com a gente, exalando seu cheiro de carniça forte. E é melhor você sentir esse cheiro com gente ao redor, porque, se ninguém o sentir, você já saberá que é ele. À espreita.
Júlio ouve o que Antônio afirma e se lembra do cheiro de carniça que sentiu pela manhã, na sala da sua casa, quando estava só e fechando a casa para ir ao trabalho. Júlio sorri, Antônio continua: Você ri, né? Se um dia você sentir esse cheiro, como eu senti, quero ver o que você fará. Todo mundo um dia vai sentir a carniça que batiza o seu destino próximo. E, pior, depois que você sentir o cheiro de carniça do Demônio, reze para que o cheiro não fique impregnado na ponta de seus dedos. Porque esse é o sinal de que ele não veio para apenas rir de sua cara.
_Quem te disse essas coisas, seu maluco? – Amanda pergunta, sorrindo e dando tapas no peito de Antônio.
_Um dia eu estava no banheiro de casa e senti o cheiro, muito forte. Fiquei quase o dia inteiro com aquele cheiro de carniça podre pela casa. Ninguém sentia. Entrei na internet e li sobre isso, esse cheiro de carniça.
_Você leu na internet? Que nada, Deus é o reflexo do Demônio – Júlio pergunta e afirma, caindo em gargalhadas.

À noite, quando chega em casa, Júlio ainda sente o cheiro de carniça em sua sala, o cheiro espalhou-se pelo quarto onde dorme, pelo banheiro, cozinha. Ele sai pelo quintal e não acha nenhum bicho morto. Acende um incenso, novamente na sala. O cheiro melhora. Descrente de Deus ou Demônio, pensa: amanhã eu chamo o dedetizador.
Por um vício que tem desde criança, de cheirar suas mãos, Júlio cheira a ponta de seus dedos. Carniça pura! Ele pensa.
Em seu ouvido, uma voz concisa, séria, diz:
_Você já sabe por que estou aqui.

Três dias depois, um amigo do trabalho veio à casa de Júlio. Depois de abrir a porta com a ajuda de um chaveiro, constatou o cheiro de carniça que habitava em seu jardim. No jardim, o seu amigo de trabalho ficou espreitando. Dentro da sala, o chaveiro, que entrou só na casa, vê Júlio com os pulsos cortados, branco, deitado e encolhido, como se estivesse com o frio. “Com frio por cima duma poça de sangue” o chaveiro pensa em um bom título para mais um post em seu blog. O chaveiro tira o seu celular do bolso e faz uma foto de Júlio.
Fora de casa, o chaveiro comenta com o amigo de Júlio: cara, eu vou a uma lan house conferir meus e-mails. E você? Vai chamar o IML?

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Leia mais no link:
http://issuu.com/joseaugustosampaio/docs/imagineonline


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